Resenhas

It, a Coisa

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Um garotinho de cinco anos sai para brincar com seu barquinho de papel na chuva e encontra um palhaço no bueiro. E esse palhaço, além de não ser nada engraçado, com certeza foi o responsável por despertar a fobia que muitas pessoas têm dessa figura, o qual Stephen King, em seu calhamaço de mais de mil páginas lançado em 1986, transformou no pior pesadelo de uma cidadezinha chamada Derry.
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Em It, a Coisa acompanhamos a vida de sete personagens em dois momentos. Um deles é em 1958, quando, ainda crianças, eles têm sua primeira experiência com Pennywise, o tal palhaço citado acima. O segundo momento apresentado na narrativa é 1985, quando os protagonistas, já adultos, recebem um telefonema que trará de volta lembranças muito desagradáveis.
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Esse é um livro em que vamos descobrindo os fatos junto dos personagens, o que, unindo a uma escrita fluida e cativante, mesmo que bastante descritiva, nos permite um bom ritmo de leitura. Pennywise é uma figura misteriosa e extremamente violenta. Cenas que narram a morte de crianças não são raras, portanto prepare o estômago.
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Como são sete protagonistas, é esperado que o leitor se identifique mais com uns do que com outros, mas King criou personagens que, no geral, são cativantes e vivem dramas que vão além do monstro que as assombra. Aliás, se fosse para definir o tema central de It, poderíamos dizer que é a capacidade de superação que uma amizade pode despertar em nós. Juntos, eles formam o Clube dos Otários, onde só “perdedores” podem entrar: o gago, o negro, o gordo, o superprotegido, o judeu, o sem graça e a menina que sofre violência doméstica. Mas, mais do que isso, o que vai unir esse grupo é a vontade de derrotar a Coisa.
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O terror, portanto, pode ser considerado sob duas óticas, a da fantasia e a da realidade. Uma é a ameaça mortal à solta em Derry, representada pela figura do palhaço e culminado em momentos sanguinolentos e selvagens; a outra são os abusos sofridos pelo núcleo infantil em cenas capazes de nos abalar com imagens fortes como a de uma criança cortando outra com uma faca. Todavia, é a junção de tudo isso o que justifica a classificação dessa como uma obra de horror.
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Numa história onde a perda é tema constante, onde o valentão da escola vem temperado com pitadas de insanidade e onde as crianças estão em constante perigo, também há espaço para a ternura e para o despertar do amor. Ao mesmo tempo em que It, a Coisa é um livro aterrorizante, é também apaixonante. Sim. Não há como o leitor não se apaixonar por pelo menos um personagem, ou pelo companheirismo do grupo, que resiste até ao esquecimento. Obviamente, crianças são mais capazes de nos encantar, mas Stephen King mantém a magia daqueles indivíduos mesmo depois de adultos.
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O escritor também foi muito bem-sucedido no que diz respeito à transição entre as narrativas do presente para o passado. O texto se apresenta como um filme passando em nossa mente: num instante estamos em 1985, daí a imagem começa a desfocar e estamos de volta em 1958.
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Há erros sim, um deles bastante grave, inclusive. Sem entrar em detalhes, mas, ao colocar crianças em uma situação que não caberia nesse tipo de história nem se fosse escrita com adultos, King nos choca negativamente pela primeira vez em quase mil páginas. É uma questão pessoal gostar ou não do texto descritivo de It, ou da violência explícita e sem limites, ou até mesmo da explicação final sobre a Coisa, mas para a cena citada acima, me desculpem, não há perdão. O livro não fica totalmente prejudicado por causa dessa escolha do autor mas me impediu de classificá-lo como um favorito, assim como tenho certeza que aconteceu com muitos outros leitores.
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Em entrevistas, Stephen King já afirmou que escreveu algumas de suas obras sob a influência de entorpecentes. Dentre essas obras está It, o que pode explicar o final confuso, que divide opiniões. Particularmente, como é um livro permeado por elementos fantásticos, aceitei a explicação que foi dada.
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No mais, sabemos que existe uma certa resistência a autores populares como King e até uma tendência infeliz a diminuir suas obras. Contudo é necessário reafirmar que é louvável quando essa popularização acontece amparada no talento, o que é o caso aqui. Stephen King, de fato, merece o sucesso que alcançou e It, a Coisa é prova disso.
Autor: Stephen King
Editora: Suma
Nota: 5/5

3 Comentários

  • Michelly Santos

    Oi Dora!
    Eu tb ficava adiando a leitura por causa do número de páginas, mas o texto é muito fluido, tem muitas falas e a gente fica querendo saber o que virá a seguir. Tudo isso junto faz com que a leitura seja rápida!
    Agora eu engatei nos calhamaços e vou logo encarar Os Buddenbrook, do Mann. 🙂
    Beijos!

  • Dora Sales

    Quero muito ler esse livro e outros do Stephen King, mas confesso que o número de páginas me assusta bastante hahaha Já li livros tão grandes quanto esse e é sempre uma tortura para tomar coragem e ler XD
    Adorei a resenha!
    Beijão =D

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