Resenhas

A Festa do Bode

Ao finalizar a leitura de A Festa do Bode, do peruano ganhador do Nobel, Mario Vargas Llosa, cheguei à conclusão de que esse é um livro onde absolutamente todos os personagens estão, no mínimo, equivocados. Apesar disso, e talvez aí resida a genialidade do autor, é uma obra magnífica, que cumpre a missão de hipnotizar o leitor do início ao fim. Missão essa que se torna ainda mais louvável quando levamos em conta a narrativa não linear apresentada, a qual foi pensada com muito cuidado para não se tornar confusa.

Fato é que não existe a possibilidade de o leitor não se encantar com o texto criativo e inteligente de Vargas Llosa. Eu costumo dizer que não se ganha um Nobel à toa, e essa obra veio para corroborar meu pensamento.
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O enredo que preenche 450 páginas trata, basicamente, da queda do ditador dominicano Rafael Leonidas Trujillo Molina. Durante a obra somos guiados através de três momentos diferentes. O primeiro deles nos apresenta uma garota radicada nos EUA por mais de 30 anos que volta à República Dominicana para visitar o pai. A garota, agora mulher, é Urania; o pai é Agustín Cabral, um dos braços direito de Trujillo. A segunda narrativa acompanha o próprio Trujillo e a forma com que ele se relaciona com as pessoas ao seu redor. Por fim, temos o grupo que trama o atentado contra o ditador, onde o leitor conhece um pouco da história desses personagens e o papel de cada um na conspiração.

Os capítulos vão alternando nessas três linhas narrativas, mostrando pontos de vistas diferentes para cada acontecimento mas sempre acrescentando informações importantes, que nos dão a dimensão da crueldade do Generalíssimo e sua trupe. Se prepare para cenas de tortura que exigirão estômago forte até para os mais acostumados à esse tipo de cena.

Num texto que trata de temas políticos mas que, felizmente, foge da armadilha de se converter em propaganda desta ou daquela ideologia, não se definem heróis nem vilões, inclusive com relação ao ditador. O autor deixa claro os avanços vividos durante esse período ao mesmo tempo em que mostra o alto custo disso para a sociedade. A trama inteira é feita de personagens movidos pelo ódio. Ódio de um povo, de um governante, de um pai. Como disse no início desse texto, não há como ficar do lado de ninguém nessa história pois todos estão preocupados única e exclusivamente com seus próprios interesses, incluindo aqueles que tramaram a morte do ditador.

Llosa faz o que quer com o leitor, guiando nossa mente em várias direções e culminando num desfecho impactante, mesmo que, de certa forma, previsível a partir de um momento, ligando perfeitamente o início ao fim da narrativa.

Uma das críticas mais contundentes do autor se refere ao acúmulo do poder nas mãos do Estado, nesse caso, representado por Trujillo. Pensando por esse lado, A Festa do Bode poderia ser uma distopia digna do grande George Orwell, contudo o mais assustador é que a obra tenha sido baseada em fatos reais, na história da ditadura que assolou a República Dominicana durante 30 anos.

O culto a um governante corrompido como um ser quase supremo parece absurdo mas é assustadoramente atual. E isso é o mais triste, pensar que ainda hoje existem regimes semelhantes ao de Trujillo, como em Cuba, Coreia do Norte e nossa vizinha Venezuela.

A edição da Alfaguara não tem extras, mas conta com uma excelente tradução da dupla Paulina Wacht e Ari Roitman, além de páginas amareladas que tornam a leitura bastante confortável.

Gosto muito de uma frase de Oscar Wilde onde ele diz que “definir é limitar”, e seria um crime limitar as possibilidades de mensagens e aprendizado em A Festa do Bode, portanto é impossível definir essa obra. Espero que vocês, leitores, tenham a mesma oportunidade que tive de conhecer essa história através da escrita magistral de Mario Vargas Llosa. Só assim vocês entenderão tudo o que ela representa.

Autor: Mario Vargas Llosa
Editora: Alfaguara
Nota: 5/5

11 Comentários

  • Ozzy

    O nome desse livro é 'A Tentaçao do Impossivel', ele é um ensaio que o Llosa fez sobre 'Os Miseraveis', a publicaçao dele aqui no Brasil é da Alfaguara tambem.

  • Ozzy

    Ohayou,
    Eu nunca li Llosa, mas e um dos autores que esta na minha lista, inclusive estou louco a procura de um dos livros dele para usar como material de apoio para minha leitura de Os Miseraveis.
    Nao sei se vou conseguir colocar as maos em um livro dele esse ano, mas meu interesse e grande ( e uma das bibliotecas que frequento tem varias obras dele no catalogo).
    xoxo

  • Nanda Sales

    Nunca tinha ouvido falar nessa obra, mas se o autor ganhou um Nobel da Literatura, então não posso deixar de ler! Já marquei no Skoob como "Quero Ler" para não esquecer de comprar.
    Adorei a postagem! Obrigada por divulgar essa obra, se você não tivesse postado sobre a mesma, talvez eu nunca conheceria.
    Beijinhos <3

  • Dora Sales

    Sabe aqueles livros que a gente já se apaixona só de olhar a capa? Acaba de acontecer isso comigo haha
    Que capa maluca e ao mesmo tempo lindíssima! E ainda é de uma editora que gosto muito =D
    Também gostei muito da trama, parece algo muito interessante. Adorei a resenha <3

    Beijão

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