Literatura descomplicada

Um amor chamado literatura gótica

Castelos, tempestades, incêndios, segredos do passado, mortes misteriosas… Sempre que você encontrar algum livro com essa ambientação pode ter certeza que está diante de um gênero nascido na Inglaterra no século XVIII chamado gótico, o qual teve como marco a publicação de O Castelo de Otranto, de Horace Walpole.

Vários estudos na área da literatura mostram que a mitologia nórdica difundida através da tradição oral foi uma das grandes fontes de inspiração dos autores clássicos dessa escola, cuja produção não se restringe à Inglaterra mas também tem importantes representantes na Alemanha, França e EUA. O Brasil, mesmo  não tendo uma tradição na literatura gótica, também tem seus representantes, sendo Álvares de Azevedo e Cruz e Souza os nomes mais relevantes.
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Mas, afinal, por que eu gosto tanto desse estilo de literatura?
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O primeiro motivo é que não há nada mais instigante do que uma história onde são retratados personagens misteriosos, donzelas em perigo e paisagens sombrias, o que é a base do gótico. Como não devorar as poucas páginas de Noite na Taverna para conhecer as histórias macabras daqueles amigos, ou não ficar angustiado testemunhando uma mocinha definhar e ninguém desconfiar da influência maligna do famoso Conde Drácula, ou até mesmo se sensibilizar com a condição de abandono do monstro sem alma criado por Victor Frankenstein?
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O romance gótico te prende por causa do mistério, te coloca dentro da história através das descrições minuciosas de lugares sombrios e faz um uso espetacular das forças da natureza a fim de despertar todo tipo de emoção.
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Meu amor por esse tipo de história vem, na verdade, desde a infância, quando li uma antologia chamada Contos de Assombração. A obra reúne nove textos de vários autores latino-americanos, mesclando as tradicionais histórias de fantasmas com lendas do folclore indígena e africano. Esse é, sem dúvidas, meu livro preferido da infância e desde que o conheci passei a me interessar cada vez mais por histórias de terror.
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E já que usei o termo “terror”, vale fazer um importante adendo. Segundo Otto Maria Capeaux, a literatura gótica se divide em duas ramificações. Uma delas seria composta pelas obras cuja explicação do mistério tem ligação direta com o sobrenatural. Essa é a literatura que conhecemos como terror ou horror. Mas também existe uma outra vertente cuja solução do enredo é racional, mesmo que os elementos sobrenaturais tenham estado presentes durante a história. E olha que interessante, esse segundo grupo foi o que deu origem ao que hoje conhecemos como romance policial. Falando por mim, isso explica muita coisa, já que eu também gosto muito desse tipo de literatura.
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Grandes mestres do passado nos dão excelentes exemplos dessa ligação, como Arthur Conan Doyle e seu O Cão dos Baskerville. Essa trama é recheada de elementos sobrenaturais e características típicas dos romances góticos como lendas familiares, pântano, névoa e, claro, um cão demoníaco, mas a solução do caso é totalmente racional. Outro bom exemplo é o gênio do terror Edgar Allan Poe, responsável pelo primeiro detetive da história da literatura que atua em histórias permeadas pelo sobrenatural mas com soluções racionais.
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Outro motivo do meu amor pela atmosfera gótica é sua capacidade de se expandir e se adaptar a todos os tipos de literatura. Em Jane Eyre, por exemplo, um dos meus livros preferidos, encontramos características desse gênero na trama referente ao mistério do sótão. Outro livro de uma Brontë que traz características góticas, e que também figura entre meus favoritos é O Morro dos Ventos Uivantes.
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Sei que muitos leitores têm uma certa resistência à literatura de terror, e sei também que na maioria das vezes que falamos sobre o estilo gótico, automaticamente ligamos uma coisa à outra. Contudo, além da distinção entre as duas vertentes já citadas, cabe uma outra observação sobre o assunto, o que inclusive também é uma razão da minha admiração por essas obras.
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A missão de um livro não deve ser simplificada a ponto de pensarmos que ele existe para nos entreter. Isso também, mas um livro pode te ensinar sobre o passado, pode te ajudar a desenvolver seu raciocínio e pode provocar reflexões importantes que você levará por toda sua existência.
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Os góticos te ensinam sobre o passado ao passo que os clássicos desse gênero foram escritos em séculos remotos. Portanto, o que os autores demonstram em suas histórias é a cultura e a sociedade da época em que viveram, o que é uma forma deliciosa de aprender história. Eles te ajudam a desenvolver o raciocínio graças à forma com que foram escritos e aos mistérios que são propostos, colocando nosso cérebro para funcionar a fim de desvendá-los. E te fazem refletir porque sempre trazem mensagens relevantes nas entrelinhas, como em Frankenstein, onde a autora nos põe a pensar sobre as consequências de nossos atos e a construção do caráter.
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Pois é, aposto que você nunca tinha parado para pensar em quão vasto é o terreno chamado literatura gótica. Eles são muito mais do que histórias aterrorizantes para gerar medo. Muitas vezes essa nem é a intenção, se analisarmos com atenção. E percebendo tudo isso não tinha como eu não me apaixonar por esse tipo de literatura, e é assim que eu justifico e declaro todo meu amor por eles.
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