O duplipensar de George Orwell
A literatura nos dá a oportunidade de expandir nossos horizontes, mergulhar em novos mundos e em novas ideias. Não são raras as teorias criadas por autores que extrapolam as obras que estão inseridas e passam a definir comportamentos na vida real. Talvez um dos conceitos mais conhecidos e discutidos seja o duplipensar, descrito por George Orwell em sua obra-prima, 1984.
O livro, um dos grandes clássicos mundiais, se passa em um lugar controlado por uma organização política totalitarista denominada de Partido. Seu líder é conhecido como Grande Irmão e a população é observada o tempo inteiro através de teletelas, sendo proibida qualquer manifestação que vá de encontro ao que é determinado pelo governo.
Orwell inseriu em sua narrativa distópica vários elementos que a tornaram referência em discussões políticas de todas as vertentes, e um deles é justamente o duplipensar. Obviamente todas essas discussões são válidas mas hoje nosso objetivo se restringe a compreender o conceito para tirar o máximo de proveito da leitura de 1984.
Portanto, para entendermos o duplipensamento temos que, antes, nos atentar a outro conceito: a novilíngua. Essa era a língua oficial da Oceania, país onde se passa o clássico de George Orwell, tendo sido instituída para atender às necessidades ideológicas do Partido. Ou seja, as palavras foram esvaziadas e passaram a assumir um novo significado que atendia a determinados objetivos políticos. Aos poucos a população vai repetindo e perpetuando aquele significado distorcido até que ele seja aceito como verdade.
Fato é que quando você altera o sentido das palavras você consegue direcionar o pensamento e, por consequência, o comportamento das pessoas. Em 1984, esse direcionamento ideológico vai desde a escola, onde as crianças aprendem a doutrina do Partido, até a idade adulta, quando a população é instigada no chamado “Minuto do Ódio”.
E é aí que entra o duplipensar, agindo como ferramenta de controle. O termo significa a aceitação, ao mesmo tempo, de duas ideias que se contradizem, desde que elas atendam à causa (no caso do livro, a causa é a manutenção do Partido no poder). Logo, tudo bem despejar todo o ódio sobre um suposto inimigo (Minuto do Ódio) quando isso é feito por amor ao Grande Irmão.
O próprio texto de Orwell diz que a verdade é aquilo que o Partido determina. “É impossível ver a realidade exceto pelos olhos do Partido”, afirma um dos personagens da trama.
De uma forma bem simples, funciona assim: mesmo que você saiba a verdade de um fato, se seus líderes disserem que a verdade é outra você aceita e realmente acredita nessa nova verdade mesmo tendo consciência da verdade verdadeira. O exemplo vem de um preceito do próprio livro quando a narrativa diz que, se o Partido afirma que 2 + 2 é igual a 5, então 2 + 2 será igual a 5, mesmo que você saiba que a resposta correta seja 4. Confuso, mas isso é o duplipensamento (pensamento duplo).
A manutenção do governo, inclusive, se ampara totalmente nesse conceito pois o duplipensar faz com que a população aceite as contradições do Partido ou até mesmo sequer as enxergue. Dessa forma o Grande Irmão se perpetua no poder usando um povo vigiado, tolhido e controlado através do duplipensamento.
É plausível dizer que o ser humano é, por si só, contraditório e por isso lida diuturnamente com conceitos opostos. Existe até um termo técnico para isso: dissonância cognitiva. Acontece que nosso cérebro está preparado para resolver essa oposição de ideias, o que não ocorreria na sociedade de Orwell, visto que o duplipensar doutrina a pessoa para que ela enxergue as contradições como algo natural e racional. As pessoas literalmente param de raciocinar, apenas repetem conceitos predeterminados.
Poderíamos, sim, discutir inúmeras similaridades entre 1984 e nossa sociedade atual, inclusive no que tange ao duplipensar. Com certeza é uma reflexão importante para nossa construção enquanto ser político e social, mas aqui, como dito lá no início artigo, a intenção é apenas desvendar o conceito criado por George Orwell para que o leitor aproveite a narrativa de forma plena. Espero que esse objetivo tenha sido alcançado.
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2 Comentários
Diana Canaverde
Super interessante a sua leitura, confesso que este tipo de livro não me ascende para ler não, eu estou lendo um livro super bom para área profissional que comecei em Fevereiro e ainda nem cheguei na metade. Mas faz parte, nada pressionado demais sai. De qualquer forma a premissa é interessante a para quem curte este tipo de ensejo é uma boa pedida.
https://minhasescriturasdih.blogspot.com/
Michelly Santos
Oi Diana!
Essa é só uma teoria inserida no livro 1984, de George Orwell! O livro mesmo vai muito além disso, é uma distopia sobre um governo totalitário controlado pelo Grande Irmão. Tem resenha aqui no site, deixei o link no texto! Vale muito a pena! 😉
Beijos!